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CAMPO & CIDADE

Caldo de Cana do Valdir

Dia desses o grupo da cana-de-açúcar deu novamente rédeas à boa prosa. Desta vez na propriedade de Valdir Batista, estrada Neudorff, região da Vila Nova, recanto singular da bela Joinville. E que grata surpresa!

Neudorff poderia ter sido o cordão umbilical de Joinville. O começo de tudo, mas não foi. E menos ainda a bucólica Anaburgo, outra freguesia mais ao norte.

De Neudorff, segundo Valdir, restou apenas o traçado original, vestígios remanescentes a oeste ainda por ali, cercania da serra Duas
Mamas.

Valdir, filho da região, atuou por longos anos na Polícia Ambiental, sendo um dos pioneiros na corporação. Aposentando-se, tomou a decisão de cuidar de um sítio que já vinha a tempos amanhando.

Um belo sítio, percebe-se de chofre. O pórtico, lá está portentoso. Âncoras alargadas. Em letras garrafais estampadas ao alto, expressa aconchegos:

- Sítio Neudorff.

O acesso - ladeado por densa vegetação nativa. Esparsa, deslumbra os visitantes. Muitas palmeiras juçaras, abundantes, bordejam o trajeto. E árvores. Põe árvores nisso! Exuberantes. E arbustos, e cipoais, típicos da Mata Atlântica. Aves piando daqui e dacolá. Solfejos no ar. Matina, uma brisa suave, folhas dançavam ao relento.

Mais ao fundo, a morada, o galpão, incrustados no verde. Acolhedora e simpática a recepção. Valdir esbanja alegria. Café e a boa cuca à mesa. Tudo nos trinque. Rodrigo Simões e Dione Benevenutti - agrônomos da Epagri -, iriam explanar sobre o processamento e o uso de biofertilizante, insumo melhorador de solo.

Para isso, além do kit da Epagri, em operação, Valdir montou um outro que será utilizado na propriedade. O biofertilizante produzido a partir de ingredientes como farinha de peixe ou casca de camarão seca e moída, melaço, fécula de mandioca, amido de milho, farelo de arroz ou trigo, matéria orgânica (esterco ou serapilheira), na quantidade recomendada, devidamente fermentado (sistema aeróbico), é um excelente ativador da micro vida no solo. Revigora a microfauna.

Sabemos que o solo além da parte química: nutrientes e da física: granulometria e porosidade, entre outras peculiaridades, tem a parte viva:
milhões e milhões de micro-organismos associados à matéria orgânica. E o biofertilizante os potencializa, estimulando-os, se benéficas e, ao
mesmo tempo, inibindo-os quando indesejáveis. O emprego desse insumo tem dado excelentes resultados. Saltam aos olhos. Caso do lúpulo cervejeiro, por exemplo, lavoura do Puccini na Estrada Mildau.

Valdir faz questão de apresentar a propriedade: mais de 90% coberta de Mata Nativa. Um paraíso. E, numa clareira nas proximidades, a lavoura de cana-açúcar. Cana orgânica devidamente certificada pela Ecovida.

Destina-se à produção de garapa, famoso caldo de cana. E quem não o aprecia. Ainda mais orgânica, sabor único, segundo Valdir. Aponta para uma touça de bananeira... Petiçinha, assim denominada em função do porte baixo. Boa de cacho, informa. Um cacho enorme,
quase beijando o chão, a prova viva à vista.

Por fim, evocando bons tempos de vigilância ambiental e de escoteiro, fala de trilha na Mata. A maneira de fazê-las sem comprometer a
vegetação. E, sobretudo, quanto ao comportamento dos trilheiros. Muita atenção. Muitas paradas. Olhar atento. Panorâmico. Nada pode escapar: aroma, cores, forma da vegetação: tronco, ramos e folharada. Flores e frutos. E, subitamente, olhando para o alto, aponta para a copada de palmeiras juçaras ao alcance dos olhos, e inciso pergunta: qual delas é a
planta macho. Ousa, sutilmente desafiar-nos, Valdir.

Diante do silêncio, mata a charada:

- Vejam aquela ali: bainha folhar escamada, folíolos encarquilhados. Florescência acobertada. À vista, apenas um diminuto um esporão. Boas gargalhadas! Linguagem da natureza. Interpretá-la, eterno desafio.

A palmeira juçara, embora apresente flores masculinas e femininas na mesma raquis, dispostas em tríades, nelas dificilmente verifica-se o auto cruzamento. Abrem em tempo diferente as flores; daí a importância de agentes polinizadores: insetos e o vento, entre outros.

Como diz Adilson Ex-colega do Valdir da polícia ambiental: - Quem se aposenta deve procurar fazer alguma coisa, especialmente aquilo que
gosta. Nada de acomodação. Adilson, hoje, dedica-se à construção civil.

E Valdir também tem lá sua receita de bem viver. Ou melhor: conviver. Faz questão de ressaltar: prender-se ao passado, pode provocar depressão; pensar só no futuro, agrava a ansiedade. Viver o presente - e fazer aquilo que se gosta -, uma benção de Deus.

Imagina, então, cercado de exuberante floresta, de aves e de produção orgânica. Põe bem viver nisso. Garapa do Sítio Neudorff, uma boa pedida. Vamos, então, a um saboroso caldo de cana. Alvissaras, Valdir!

Joinville, setembro 2024

Onévio Antonio Zabot
Engenheiro Agrônomo

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